Resumo:
Trata-se de um estudo descritivo, tipo relato de experiência, realizado a partir da trajetória de
uma psicóloga da equipe NASF-AB na Atenção Primária à Saúde (APS), na regional leste de
Belo Horizonte. O objetivo desse relato é analisar como as rodas de conversa, no contexto da
saúde pública, podem ser uma estratégia de intervenção e produção do cuidado em saúde. A
Atenção Primária à Saúde (APS) é o primeiro nível de atenção em saúde, sendo a Estratégia
Saúde da Família (ESF) parte dessa rede, que surge com o intuito de superar o modelo
tradicional de cuidado em saúde centrado na doença e em práticas predominantemente
curativas. Em 2008, o Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF) é instituído com o
objetivo de apoiar as Equipes de Saúde da Família, na tentativa de superar a lógica tradicional
de assistência à saúde, incorporando a corresponsabilização, gestão integrada do cuidado e
atuando na clínica para além da fragmentação do sujeito. Partindo do relato da experiência com
um grupo de mulheres desenvolvido em uma Unidade Básica de Saúde (UBS), intitulado “Se a
boca fala o corpo sara”, pudemos refletir sobre como as práticas de grupo, no formato de rodas
de conversas, contribuem para o cuidado em saúde de mulheres consideradas poliqueixosas
pelos profissionais de saúde da atenção primária. Habitualmente o sofrimento somente é
percebido ou localizado com o desencadeamento de sintomas físicos inscritos no corpo, levando
a procura dos serviços de saúde, onde geralmente a oferta para a cura são os medicamentos os
quais nem sempre promovem resolutividade para as queixas das usuárias. Este formato de
assistência possibilitou que as usuárias problematizassem o seu cotidiano, as relações consigo
e com o mundo, e ao mesmo tempo, construíssem um novo olhar para as práticas da psicologia
na saúde pública, fundamentalmente na atenção primária. Foi na tentativa de desconstruir o
padrão habitual da racionalidade biologicista que utiliza a lógica sintoma-diagnóstico, e ofertar
uma estratégia para cuidar, acolher, compreender e legitimar os diversos formatos de expressão
do sofrimento, apropriando-se dos conceitos de humanização que definem a prática de uma
clínica ampliada, que as rodas de conversa foram pensadas. O recurso da fala e o espaço para a
escuta permitiram a descoberta de soluções individuais e comunitárias, ampliando as redes de
alternativas para enfrentar os desafios da vida. Podemos concluir que abrir-se para o
entendimento diferenciado de como enfrentar a doença/sintomas pode ressignificar a escuta
promovendo sua função acolhedora pelo profissional de saúde e uma atenção à saúde mais
integral, dialogada com os modos que cada um encontra para construir sua saúde e vida.